giovedì 23 dicembre 2021

Encarnação e missão

 O paradigma de toda missão cristã



Deus entrou na história humana através do mistério da encarnação do Verbo eterno. O Pai enviou seu Filho amado para salvar a humanidade de um modo tão simples e enraizado, que nos deixa perplexos: o Criador se fez criatura; o Onipotente se fez dependente; o Eterno se fez mortal... Este é o jeito de Deus realizar a sua missão. Este é o paradigma de toda missão cristã: 30 anos de silêncio, de escuta, de aprendizagem, de meditação, para só depois expor os mistérios profundos de Deus através de gestos e palavras simples ou de exemplos de situações cotidianas que podiam ser compreendidas por todos. E “falava com autoridade”.

Francisco de Assis entendeu que o mistério do presépio nos ensinava um projeto de vida e de missão, por isso ele “gostava tanto de lembrar a humildade da encarnação” e quis “ver com os próprios olhos” e sem enfeites a minoridade de Deus, para adequar-se a ela.

A encarnação deve iluminar o nosso projeto missionário. Quem contempla com os olhos da fé a humildade de Deus sabe que a missão exige primeiro encarnar, “submeter-se a toda humana criatura”, aprender... para só depois encontrar o momento e o modo justo para abrir os tesouros da revelação.

Que Francisco de Assis nos ajude a contemplar com os nossos próprios olhos no presépio o protótipo do irmão menor que aceita viver a missão cristã neste mundo. 

Paz e bem.  

martedì 12 ottobre 2021

Capuchinhos: uma ordem missionária

 Renovar o espirito missionario





São Francisco de Assis desde o início quis que sua ordem fosse missionária. Ele foi o primeiro fundador a escrever na sua Regra de vida sobre os freis que, por inspiração divina, iriam partir para além das fronteiras cristãs e dava instruções de como atuar na missão.

Nós, capuchinhos, fomos grandes missionários. Nosso ideal era ser: missionários e santos.

Nos séculos XVII, XVIII e XIX, generosamente colaboramos com Propaganda Fidei, de fato, milhares de freis deixaram sua terra natal e foram ajudar a estabelecer a igreja em muitas partes das Américas, África e Ásia.

No início do século XX, a Ordem decidiu que cada província deveria assumir uma missão, o que gerou um novo vigor missionário nos freis da Europa e da América do Norte, onde já tínhamos províncias estabelecidas.

Hoje, Deus nos desafia novamente a renovar o espírito missionário capuchinho. A Ordem está aprendendo a ser missionária também a partir das suas novas fundações: agora são os freis africanos, indianos, asiáticos, latino-americanos e brasileiros que principalmente estão partindo para as missões.

Ser capuchinho é ser missionário! Não deveria existir nenhuma circunscrição sem missionários fora de seu território. Cuidemos e valorizemos esta característica do nosso carisma, ensinemos aos nossos formandos o valor da missão e ousemos deixar a nossa estabilidade para dar a vida onde Deus nos envia. A missão dá um novo vigor às nossas circunscrições.

missionicap@gmail.com

giovedì 22 aprile 2021

O ANÚNCIO DO EVANGELHO

 Nos consideramos todos missionários



Constituições
DOS FREIS CAPUCHINHOS

CAPÍTULO XII

O ANÚNCIO DO EVANGELHO E A VIDA DE FÉ

 

N.° 176

COMENTÁRIO DO FREI ANTONIO BELPIEDE *

 

(Traduzido ao portugues por fr. Marcos Roberto Rocha de Carvalho)

 

 

            “O Rei é Rei de todos, menos do seu camareiro”, diz um velho provérbio, que também pode ser usado – mutatis mutandis – para outros regimes que não a monarquia. O revestimento estético e a hipocrisia ética, os truques da propaganda, as perucas com bobes do rei Luís da França ou as dezenas de medalhas penduradas no peito estufado de Leonid Brejnev desaparecem diante dos olhos do camareiro particular. O rei se revela em sua humanidade cotidiana, que, às vezes, é enferma, fraca e viciosa. Os cachos da peruca dão lugar à realidade da perda de cabelos por estresse do governo ou à calvície impiedosa. O rei se mostra nu aos olhos de seu camareiro, do qual se espera que seja fiel a sua pessoa e à coroa.

 

            Assim, como um camareiro leal ao seu Rei, o Procurador-Geral vê a Ordem sem peruca, sem medalhas no peito, sem maquiagem, sem as auréolas de nossos santos, em seu cansaço, em seu desejo de servir que, às vezes, se choca com a vileza e baixeza, preguiças que vem dos quatro pontos cardeais, segundo um alternar-se que só o Senhor da história pode compreender.

 

            Quando se fala da Ordem aos noviços ou aos freis jovens, ela é representada como um jardim de árvores belas e frutuosas. As oliveiras estão representadas, com a dupla cor da folhagem - prateadas e verdes, segundo o lado que move o vento, vinhas repletas de cachos vermelhos e graúdos que prometem taças de vinho delicioso, figos muito doces que se racham no fundo, com sulcos brancos e vermelhos, porque já estão maduros e à espera de nutrirem com doçura. Mas a vida nos faz conhecer até mesmo o espinheiro, presunçoso em sua deformidade estéril, que, como na alegoria de Joatão, insiste com as outras plantas para elegê-lo rei (Jz 9,7-15).

 

            Não é caridade negar a verdade. É prudência cobrir a nudez do irmão, como a do Rei. Mas para nós, chamados a viver o Evangelho, a maior caridade diante da realidade da fraqueza e do pecado consiste em lembrar e testemunhar a onipotência de Deus. Ele é capaz de transformar o espinheiro desagradável, afiado e perigoso, em uma chama perene e crepitante de energia, de fé e de beleza. O espinheiro do nosso limite, da nossa possível miséria, não deve ser escondido sob um tecido que camufla, mas exposto ao sopro perene do Espírito para que queime como a sarça que encantou Moisés e motivou-o para a Missão.

 

            Na origem da missão da Ordem, não existe, portanto, uma representação adocicada da santidade com "cheiro de talco", mas uma fé forte naquele que é capaz de nos transformar em sarça ardente de evangelização perene, como fez voltar, subindo rapidamente com alegria, Cléofas e o seu companheiro a quem «fez arder o coração no peito, explicando-lhes as Escrituras sobre a sua paixão» (cf. Lc 24,13-35).

 

            Simão Pedro, que se levanta com os outros onze no dia de Pentecostes e começa seu primeiro discurso, é um homem ferido e curado. Não é um "noviço impecável", mas aquele que negou por três vezes o fato de conhecer o Mestre. Por que devemos falsificar os modelos formativos e a imagem da Ordem com aparências retóricas de santidade? Quando a liturgia, no Cânon Romano, afirma: "Também a nós, seus ministros pecadores ..." ela diz a verdade. A força do Evangelho se manifesta na missão, porque, na sua origem, existe um mandato muito semelhante ao recebido por Pedro no lago de Tiberíades: "Apascenta minhas ovelhas". Também aqui, três vezes. Ferido e curado é todo verdadeiro missionário do evangelho. Carl Gustav Jung, um especialista em humanidade, afirma: "Somente o médico ferido pode curar!".

 

            176,1 - Em nossa Fraternidade apostólica, todos nós somos chamados a levar o alegre anúncio da salvação aos que não creem em Cristo, em qualquer continente ou região em que se encontrem; por isso nos consideremos todos missionários.

 

            "Chamados" é algo lindo e verdadeiro. Foi ele quem nos chamou, cada um com uma vocação única e belíssima. No entanto, precisamente porque foi chamado a ser servo de todos, Francisco se declara "obrigado" a administrar as fragrantes palavras do Senhor. “Sou obrigado - teneor” (LetFed II: FF 180). As palavras do fundador soam mais jurídicas do que as do texto das nossas Constituições. Quase oito séculos depois, elas encontraram uma correspondência impensável no cânon 747 § 1, que abre solenemente o Livro III do Código de Direito Canônico, Do múnus de ensinar da Igreja: “A Igreja, à qual Cristo Senhor confiou o depósito da fé, ... tem o dever e o direito nativo, independentemente de qualquer poder humano, de pregar o Evangelho a todos os povos”.

 

            Na própria estrutura da relação jurídica existe alteridade ou intersubjetividade. Pode existir uma obrigação jurídica somente entre dois (ou mais) sujeitos. Diante do direito de um existe o dever de outro e vice-versa. O direito da Igreja de anunciar o Evangelho a todos os povos não vem de um acordo com um Estado soberano, ou com uma outra "potência humana", mas da investidura de Cristo Senhor e da assistência do Espírito Santo. Em nome desta unção divina, a Igreja reivindica, com humilde firmeza perante todas as autoridades terrenas, o seu direito nativo de proclamar o Evangelho. É dessa reivindicação de direito divino que deriva a martyria, o testemunho da Igreja que, às vezes, chega ao ponto de derramar sangue.

 

            Por outro lado, a Igreja tem o “dever”, tão nativo quanto o “direito”, de pregar o Evangelho. Quem pode se gabar da exigência de que a Igreja exerça este seu dever? Quem, afinal, é o titular do direito de "receber o anúncio do Evangelho"? “Todos os povos – Omnibus gentibus”, conclui o § 1 do cânon. Livre perante ditaduras e sistemas autoritários, como o era no início, durante as perseguições do Império Romano, a Igreja é chamada a fazer-se serva da Palavra diante daqueles que não conhecem Cristo, e também defronte daqueles que o conheceram e dele se esqueceram. São Francisco, nosso irmão, foi um poeta inspirado para dizer palavras jurídicas obrigatórias, para moldar poesia e pacto em seu coração iluminado, para transformar uma obrigação eclesial em canto universal. A poesia do Evangelho também exige isso: o dever do servo, uma Igreja serva para prestar a humilde diakonía da Palavra a todos os povos; uma Ordem servidora da Palavra, na Igreja, nas pegadas do fundador.

  

            176.2 - Além do comum empenho missionário desenvolvido em comunidades cristãs capazes de irradiar o testemunho evangélico na sociedade, reconhecemos a condição particular daqueles frades, comumente chamados missionários, que deixam sua terra de origem, enviados a exercer o seu ministério em contextos socioculturais diferentes, onde o Evangelho não é conhecido ou onde se requer o serviço às jovens Igrejas.

 

            Durante séculos, a Igreja teve a percepção teológica – canônica – psicológica de uma evidente diferença entre as Igrejas particulares de tradição antiga – sobretudo as da Europa – e os territórios de missão. O texto ecoa esta bipartição. A própria estrutura dos Dicastérios da Santa Sé mostra a solidez desta distinção também no âmbito jurídico e de governo. As dioceses mais antigas, na Europa, na América e na Austrália, dependem da autoridade da Congregação dos Bispos. As mais jovens, por outro lado, dependem da Congregação para a Evangelização dos Povos, também conhecida como Propaganda Fide, que, não por acaso, se encontra na Praça da Propaganda, ao lado da bela Praça Espanha de Roma[1]. Se as jovens dioceses são confiadas à Congregação que tem maior competência sobre os territórios de primeiro anúncio, a fortiori serão as outras estruturas hierárquicas que ainda não atinjam a maturidade suficiente para serem eretas como dioceses: sobretudo os Vicariatos e as Prefeituras Apostólicas (cf. Can. 368).

 

            No entanto, diversos sinais indicam o enfraquecimento, o desaparecimento e até a negação obstinada da fé cristã nos territórios de antiga tradição eclesial: a Europa, o continente americano e outras nações de cultura ocidental. Da omissão que nega as "raízes judaico-cristãs" no proêmio da Constituição Europeia, depois "abortada", à diminuição progressiva dos casamentos - sacramento, até à prática crescente, chamada grosseiramente de "desbatizado", que é a manifestação expressa da vontade de serem cancelados do registro de batismo, onde, a pedido dos pais, geralmente eram inscritos, após ter recebido o sacramento.

 

            As "comunidades cristãs capazes de irradiar o testemunho evangélico na sociedade" tornam-se, portanto, sempre mais frequentemente, comunidades que sobrevivem com dificuldade entre desertos de fé, sedentas da água viva que possuíam e que "perderam em parte ou totalmente" (176.3).

 

 

            176.3 - Igualmente, reconhecemos a particular condição missionária dos frades enviados a ambientes que necessitam de uma nova evangelização, porque a vida de inteiros grupos não é mais informada pelo Evangelho e muitos batizados perderam, em parte ou totalmente, o sentido da fé.

 

            Alguns anos atrás, teria sido difícil ver, qualificados como missionários, os frades enviados para uma Nova Evangelização. As nossas Constituições adquiriram e assumiram com uma expressão decidida o fato de que missionários são necessários para as antigas igrejas do então Ocidente cristão. Já faz alguns anos que tenho diante dos olhos uma bela pintura em nosso convento de Assis: um frade, com hábito de cor marfim e chapéu colonial na cabeça, se aventura com uma canoa em um rio da Amazônia. O imaginário dos católicos, das crianças e das mães, dos benfeitores e dos apoiadores das missões previa frades como este, alternados com outro panorama difundido: o da savana africana ou com aquele, sempre verde e úmido, de uma selva asiática. Esses ícones ainda têm seu valor. A Missio ad gentes deve continuar com ardor, como reforça o n. 176,2. Hoje, porém, podemos pensar em outros ícones de missão: frades conversando com jovens em um sit-in improvisado – nos Jardins du Luxembourg, em Paris, ou no Hyde Park, em Londres; leigos da OFS ou freiras tocando violão em frente ao Portão de Brandemburgo, em Berlim, ou rezando antes da pizza, na Ponte Milvio, em Roma. E do sonho e da imaginação pode-se passar a projetos concretos.

 

            Foi o grande João Paulo II, um jovem Papa de 59 anos, que pronunciou a expressão Nova Evangelização pela primeira vez. Ele o fez em seu idioma, o polonês, em seu país e em sua cidade, Cracóvia, em 11 de junho de 1979, no bairro operário de Nova Huta, onde o regime pró soviético queria construir um bairro operário ateu e sem igrejas. Mas o cardeal Wojtila, o pastor daquela cidade católica, lutou com seu povo contra a burocracia embandeirada de vermelho. Ele lutou e venceu. Ali onde se desejava implantar o ateísmo estatal, uma cruz muito alta lembra a coragem de João Paulo e sua profecia inspirada como novo Papa: é necessária uma Nova Evangelização. A palavra cresceu lentamente e foi proclamada com força na assembleia dos bispos latino-americanos, em Puebla, em 1979. Após a morte de João Paulo II, o Papa Bento XVI erigiu um novo dicastério para a promoção da Nova Evangelização. Com a Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, A alegria do Evangelho, Francisco levou-nos de volta ao desejo de alegria que o Cristo nutre por nós.

 

            Minha mãe Maria comia pouco. Éramos sete quando nos reuníamos à mesa. Ela ficava feliz por ver-nos, os filhos, devorar tudo e explicava-nos: "Estou tão satisfeita do cheiro da comida que até não tenho fome". Talvez seja este o caso desta palavra preciosa: falamos e escrevemos muito sobre a Nova Evangelização, mas não nos abriu o apetite do Evangelho, fome de uma Missão renovada. Continuamos devagar para fazer as mesmas coisas. Neste início de milênio, a Igreja se move em um mundo já cristianizado com manobras para redimensionar as fronteiras e a mudança de arquivos. Dentro da Igreja, também a nossa Ordem. Com iluminações diferentes, as províncias da Europa foram gradualmente unificadas, muitas vezes coincidindo com uma nação inteira: assim foi com França, Alemanha e Espanha. Agora a Irlanda e o Reino Unido estão em processo de unificação. Em breve, o mesmo acontecerá com os Estados Unidos e com os países de língua espanhola, na América do Sul. Possivelmente seja a única estrada a ser percorrida ou talvez não. Quem sabe fosse possível transformar as províncias numericamente pequenas em estruturas jurídicas mais leves, como Custódias e Delegações, sustentadas por circunscrições mais fortes, com um espírito missionário renovado e adaptado. Precisamos refletir sobre isso.

 

            O ponto fundamental, entretanto, é outro. Realizar uma conversão do coração e da mente e voltar para a estrada, voltar para casa. Muitas vezes, estamos engessados ​​em uma presença fraterna fraca e intimista, em uma ação apostólica que repete os antigos esquemas, que espera o povo no templo, que não ouve o grito silencioso de quem, ao nosso lado, em cada cidade da Europa e do Ocidente cristão, precisa ouvir novamente o Nome de Jesus, Deus salva, dito por alguém que creia.

 

            176.4 - Empenhemo-nos, portanto, para não deixar sem escuta ou inoperante o mandato missionário do Senhor, porque toda pessoa tem o direito de escutar a Boa Notícia a fim de realizar em plenitude a própria vocação.

 

            O mandato missionário mudou, diversificou-se. O primeiro anúncio deve continuar. Ao mesmo tempo, a Nova Evangelização deve ir além dos primórdios e tornar-se a atitude constante das igrejas de tradição antiga. Fora do templo, há uma comunidade que espera. Há uma comunidade rodeada de incontáveis ​​palavras e atordoada por mil servos eletrônicos, porém sedenta de uma palavra não apenas fresca como a água da fonte, mas também quente como a daquele Rabino judeu que falou à mulher samaritana: “Se você conhecesse o dom de Deus...” (Jo 4, 10).

 

            No final do número 176, reencontramos a palavra jurídica de Francisco. Se toda pessoa "tem o direito de ouvir o Evangelho", nós, irmãos de Francisco, temos, na Igreja, o dever de anunciá-lo, com o coração ardente como Cléofas e seu companheiro depois do encontro com Jesus.

 

            A Ordem, vista a partir da Procuradoria Geral, não se apresenta como um rei de peruca, mantido com talas e medalhas. Quanto mais conseguirmos ser homens verdadeiros, na pobreza de nossos pecados e na riqueza transbordante da investidura do Espírito Santo, mais arderemos por toda a nossa vida como a sarça que fascinou Moisés: e o enviou em missão. Amém.

 

* Procurador-Geral OFM Cap (2013-2020) -[o texto foi entregue em maio de 2020

© copyright Antonio Belpiede 2020 - utilização gratuita pela Ordem dos Frades Menores Capuchinhos



[1] Para ser completo, deve-se mencionar a competência para as Igrejas Orientais do dicastério com o mesmo nome (cf. JOÃO PAULO II, Const. Ap. Pastor Bonus, 1982, art. 56).

martedì 20 aprile 2021

Patrona de todas as missões capuchinhas

                                             A Mãe do Bom Pastor

            O sábado antes do dia do Bom Pastor (atualmente IV Domingo de Pascoa) é a festa da Mãe do Bom Pastor (Divina Pastora), devoção tipicamente capuchinha de origem espanhola, que desde quase um século é a patrona de todas as missões capuchinhas em todo o mundo.

 

Origem da devoção  


No ano de 1703, frei Isidoro de Sevilha, grande pregador popular, sente a inspiração de ser acompanhado nas suas missões por um estandarte com uma singular representação da Virgem Maria: vestida com as roupas simples de uma cuidadora de ovelhas, sentada sobre uma pedra, debaixo de uma árvore, com um chapéu comum e tendo algumas ovelhinhas ao seu redor. Certamente esta imagem contrastava com as muitas e exuberantes imagens que se tinha da Virgem, sempre com trajes muito suntuosos, coroas esplêndidas e tronos imponentes. O pregador capuchinho intuía que a simplicidade da mãe de Deus tão próxima de todos os seus filhos, e preocupada especialmente pelas ovelhas distantes ou desviadas, daria um toque especial às suas palavras e ajudaria a mexer nos corações para voltar a Deus.


De fato, isto aconteceu. A devoção à “Pastora das almas”, que popularmente se tornou a “Divina Pastora” se expandiu rapidamente com a criação de muitos grupos de fieis ligados a ela em toda a Espanha, eram o “
Rebanho de Maria”. Obviamente, não faltaram os que não aceitavam de vê-la assim, tão pobre e simples (diziam que a “sua indumentaria era indecorosa, indecente e impura”), porém venceu o sentimento popular que imediatamente se sentiu identificado com esta nova versão de Maria, mãe de misericórdia.

 

A aprovação eclesial

            Frei Isidoro procurou de muitos modos obter a aprovação eclesiástica para esta devoção e recebeu do Papa Clemente IX (1700-1721) duas bulas que concediam, de uma parte, que o altar onde se venerava a imagem da Divina Pastora fosse altar privilegiado, e de outra, que as irmandades do “Rebanho de Maria” tivessem todas as indulgências e privilégios que se davam a tais associações, porém os documentos não davam uma explícita a aprovação da devoção.


Com a sua morte, em 1750, por alguns anos esta devoção ficou em certo sentido órfã, porém encontrou no Beato Diego de Cádiz (1743-1801) um apaixonado propagador. Este capuchinho dizia ter recebido o dom da pregação através da Divina Pastora. Foi ele que escreveu os textos litúrgicos apropriados para a celebração da missa em sua honra e também da liturgia das horas, que em 1795 foram aprovados pelo Papa Pio VI, o que confirmava canonicamente esta devoção. Desde então os capuchinhos espanhóis podiam celebrar a sua festa litúrgica todos os anos na véspera do domingo do Bom Pastor, que naquela época era o segundo domingo depois da Páscoa.

Também sob o impulso do beato Diego, em 1798 um decreto do superior provincial dos capuchinos ordenava a colocação da sua imagem em todas as igrejas capuchinhas em Espanha e a proclamava patrona das missões capuchinhas espanholas. A sua devoção se estendeu por toda a Espanha, nas suas missões na América Latina, Filipinas e também em muitas partes da Itália que estavam sob influxo espanhol. Em 1885, o papa Leão XIII estendeu esta festividade a toda a Ordem.  

Surgiram, ademais, algumas congregações femininas fortemente ligadas a esta devoção: Irmãs Capuchinhas da Mãe do Divino Pastor (Beato José Tous y Soler, ofmcap); Terciarias Capuchinhas da Divina Pastora (fr. Pedro de Llisá, ofmcap); Terciarias Franciscanas da Divina Pastora (Beata M. Ana Mogas); Congregação do Rebanho de Maria (Francisco de Assis Medina); Congregação Escolapia de Religiosas, Filhas da Divina Pastora (P. Faustino Miguel, Escolapio). Como podemos notar a santidade capuchinha na Espanha encontra uma grande proximidade a esta bela devoção. 
 

        

              Patrona de todas as missões capuchinhas

           

Com o voto favorável do Capítulo geral de 1932 a Mãe do Bom Pastor foi declarada patrona universal de todas as missões da Ordem Capuchinha, no dia 22 de maio, e isto continua até hoje em vigor. De fato, as atuais Constituições aprovadas no dia 04 de outubro de 2013, afirmam no número 181,3: “Confiemos essa grande obra à intercessão da bem-aventurada Virgem Maria, Mãe do Bom Pastor, que gerou Cristo, luz e salvação de todos os povos, e que, na manhã de Pentecostes, sob a ação do Espírito Santo, presidiu em oração o início da evangelização.”

No entanto, parece que não muitas das nossas presenças missionarias, aparte daquelas de origem espanholas, puderam conhecer esta devoção e invocar a sua proteção. Certamente vale a pena torná-la mais conhecida em todas as nossas missões e obras apostólicas. A Mãe do Bom Pastor pode ser uma luz, um apoio e um estímulo no nosso trabalho missionário e apostólico, pois, sendo uma devoção tipicamente capuchinha, leva as nossas marcas e pode nos ajudar a ser mais autênticos.      

      

Mãe do Bom Pastor ou Divina Pastora?

 

            Na sua origem era chamada unicamente de Pastora pelo frei Isidoro, porém, em seguida o povo agregou o título de Divina Pastora. Também o Menino Jesus não fazia parte da imagem original, mas nas representações das décadas seguintes o Menino foi posto, colocando em maior luz que ela era a Mãe do Bom Pastor.

            Geralmente, as pessoas mais intelectuais e os teólogos preferem chama-la de Mae do Bom Pastor, ainda que em alguns pronunciamentos da Igreja se chegou a chama-la também “Divina Pastora”. Já o povo de Deus nunca sentiu a necessidade nem acolheu as razoes para mudar o seu nome. Sempre continuou a chama-la “Divina Pastora” e não porque acreditasse que ela fosse uma deusa, ou uma divindade, pois todos sabem perfeitamente que ela é a Mãe de Jesus, o Bom Pastor, mas entendem que a sua ação, o seu serviço, é divino. Ao colaborar com o projeto de Deus o seu agir se faz divino, e por isso a chamam carinhosamente: “Divina Pastora”.                    

 

     Uma Virgem capuchinha

             

Procuremos meditar em algumas das suas caraterísticas originais e interpretá-las a partir do nosso carisma capuchinho, desde os nossos valores. É importante ter presente a sua imagem nos inícios, pois com o passar dos séculos, e o crescimento da devoção, as vezes foram sendo agregados detalhes que num certo sentido obscurecem a sua simplicidade original. Vejamos:

O primeiro que nos salta aos olhos é a sua pobreza: vestida como os pobres pastores, com um simples chapéu de camponesa. Talvez, hoje depois do Vaticano II, nos parece normal vê-la neste modo mais próxima, porém foi uma fantástica intuição naquela época de tantas pompas, propor uma imagem da Virgem assim, quase repetindo as palavras de Francisco de Assis: “e mais não queríamos ter…”. Isto fez e faz dela uma Mãe próxima, desinteressada, solidaria. Ela nos convida como capuchinhos a compreender a beleza de ser pobres, de nos contentar com o pouco, de pensar uma pastoral feita muito mais com o coração que com altas tecnologias.

            Nos chama a atenção a sua minoridade: sentada sobre uma pedra debaixo de uma árvore. É a rainha do céu e da terra, porém não tem um trono de luxo. Está cômoda sobre uma pedra e procura a humilde proteção de uma árvore. Certamente não porque não mereça ou não possa ter outras comodidades e privilégios, mas porque fez opção e é feliz ao estar perto do rebanho.     

            O estar rodeada de ovelhas nos sugere que ela gera fraternidade. A Virgem Maria é agregadora. Assim como em Pentecostes ela parece reunir os apóstolos em oração, e assim continua na história, como nossa mãe, gerando fraternidade entre nós, colaborando na nossa unidade.

            O fato de estar sentada, nos faz pensar que ela é também contemplativa. Os que trabalham no pastoreio sabem que tem momentos de atividade, de conduzir o rebanho, de procurar água e pastagens, mas também tem muitos momentos que pode se sentar e contemplar, esperando com paciência que as ovelhas se saciem. No entanto, não é uma contemplação alienante, mesmo se pensa ao mistério da vida, fica sempre atenta ao rebanho, pronta a intervir imediatamente se for preciso.

            Podemos ver nela uma mulher em harmonia com a criação. Usa o que necessita do mundo: ela está vestida com pele de ovelha, está sentada debaixo de uma árvore, leva o rebanho às reservas de comida e água, porém vive uma relação respeitosa com a natureza. O pastor tem sempre muito claro que depende dos recursos naturais e por isso não pode arruína-los ou explorar mais do que se possa repor.            

            Sendo uma pastora nos fala da importância do trabalho simples. Nos lembra que o trabalho é uma graça, não um castigo. Ele é parte da nossa espiritualidade. Os nossos santos capuchinhos nos mostram que não existe santidade capuchinha sem trabalho. O trabalho manual, o trabalho discreto, aquele que talvez outros não queiram fazê-lo, são para nós ocasião de encontro, de crescimento, de comunhão e serviço.

            E por fim, a Pastora das almas é missionária. Ela surge para apoiar as missões capuchinhas e desde a sua origem cumpre com a sua missão. Ela vigia sobre nós para que nunca percamos este ideal, para que não abandonemos a pastoral, para que não sejamos insensíveis diante das ovelhas que estão se perdendo, mas com criatividade sempre renovada possamos cumprir o que o Bom Pastor espera de nós.   

            Por todos estes detalhes podemos ver na Divina Pastora uma autêntica representação capuchinha do mistério da Mãe de Deus. Tê-la presente e venerá-la em todas as nossas fraternidades pode ser um modo precioso de fazer crescer em nós a fidelidade a nossa vocação que na Espanha foi tão bem sintetizado: ser missionários e santos.

 

          Frei Mariosvaldo Florentino, ofmcap

  Secretário geral para Evangelização, Animação                                                                                     e Cooperação Missionária

 Fontes:

 Carta do Ministro Geral, Fr John Corriveau, com motivo da celebração do 3º centenário da devoção “María, Madre el Buen Pastor” (Divina Pastora), 07/10/2003, Analecta OFMCap, 2003, 647-654.

CRUCES RODRIGUEZ, José Francisco, La Divina Pastora de las almas: historia de la advocación e iconografía y su vinculación con la ciudad de Málaga, in: Advocaciones Marianas de Gloria, San Lorenzo del Escorial, 2012, 985-1004.

         

Ao longo destes séculos os artistas e a piedade popular souberam propor em muitos modos imagens da Mãe do Bom Pastor (Divina Pastora), mostrando-nos quanto é viva esta devoção…


 
 

       




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venerdì 9 aprile 2021

Progeto de Fraternidades Internacionais na Amazonas

 Amazonas te espera...



Paz e bem.

Querido frei, já faz algum tempo que a nossa Ordem Capuchinha tem um lindo sonho de ter fraternidades internacionais na Amazônia, exatamente na tríplice fronteira Brasil, Colômbia e Peru, onde já temos as fraternidades de Benjamin Constant e Leticia. 

Devagarzinho o projeto está tomando corpo, queremos duas fraternidades com freis locais e também freis de outras circunscrições que queiram viver intensamente o nosso carisma de vida fraterna, minorítica e orante, nesta realidade fortemente missionaria. 

Seria viver a missão a partir dos nossos valores capuchinhos. Sonhamos também poder realizar ali, com ambas as fraternidades, uma escola missionária para todos os pós noviços das Américas e outros freis interessados, capaz de dar uma base teórica e prática do nosso jeito de ser missionários. Precisamos encontrar freis que queiram viver esta experiência. 

E sabemos que Deus vai tocar o coração de alguns para que possam dizer sim. Se você quer conhecer melhor este projeto, entre em contato conosco. Com alegria estaremos disponibilizando os materiais que já temos e também iniciaremos um diálogo fraterno. 

Sou frei Mariosvaldo Florentino, secretario geral das missões. E você pode escrever um correio eletrônico a missioni@ofmcap.org ou mandar uma mensagem no nosso facebook: Amazonas Misioneros Capuchinos en la Triple frontera. 

Um abraço. Paz e bem.